FINADOS
Pe. Igor Damo
Texto provisório
No dia dois de novembro celebremos todos os fiéis defuntos. Finados é o dia dos que “findam”, dos que chegaram ao “fim de seu tempo”. O dia de finados surgiu no século XI com os monges do mosteiro de Cluny, na França. Tudo começou com uma missa por todos os mortos no dia seguinte à festa de todos os Santos. A intenção era ressaltar a unidade existente entre os cristãos que vivem na terra e os mortos e santos que estão na glória. Assim, hoje, o povo presa por está data, reza em favor dos seus entes queridos.
Ao visitar os cemitérios, tradicional prática nos finados, lembranças tornam-se vivas. Histórias de pessoas e/ou famílias marcadas pela alegria e também por dores e sofrimentos vem à memória. Junto a isso o povo cristão fortalece a fé na ressurreição e na esperança de que os falecidos alcancem a vida eterna.
Todos aqueles que crêem garantem a vida eterna (Jo 3, 16). Por isso, a oração em favor dos mortos é sinal de confiança. Ela toma sentido profundo a partir da fé e dos limites da fé de irmãos e irmãs falecidos, à luz daquele que oferece a eternidade, Jesus morto e ressuscitado.
Jesus dizia: “Quem crê em mim tem a vida eterna”. Isso mostra como a eficácia da oração e a própria salvação eterna tem seu auge na profundidade da fé tida em Jesus. Segundo o evangelista João Deus dá a vida a quem recebe seu Filho (Jo 5, 11). Isto é, os que morrem com Cristo, os que vivem segundo sua vontade, acreditam no evangelho testemunhando o amor entre as pessoas e a comunidade, alcançam a vida eterna.
Podemos nos perguntar: Como era a fé de nosso amigo falecido? Qual a profundidade de minha fé em Jesus dentro do contexto atual do mundo em que vivo?
No dia dos finados parece ser importante refletir a partir da morte, a vida. Ela dá chance para a salvação. Situações como mortes de inocentes causadas pela violência, pelo descaso da sociedade, pelo domínio sobre os pobres, demonstram desvios e pouca fé de pessoas... Isso pode provocar tormentos ao chegarmos, certo dia, à morte.
A morte causada pela injustiça não agrada a Deus porque machuca e abrevia a vida. “Até quando afligis minha alma e me aborreceis e não se envergonhais de me oprimir? (Jó)”. Dada está situação, a oração feita aos mortos, adquire sentido e responsabilidade para converter corações à vida eterna.
A morte, parte da vida, nem sempre é vista à luz da fé na ressurreição. Dentro disso, manifestamos certo medo diante da morte. O medo da morte nos rodeia. Diante deste mistério ficamos confusos... Especialmente por sermos ocidentais temos a vida como nosso tudo, enquanto a morte como ruína. Porém, tememo-la e em contradição não cuidamos o suficiente da vida. Assim, esquecemos de inibir as armas, os químicos, a poluição, a exploração, a corrupção, a informação maliciosa, a falta de pão e de leite e outros fatores que de certa maneira são inimigos da morte “natural”, dada ao longo dos anos ou mesmo dentro da fraqueza de cada corpo. Ainda, às vezes, duvidamos se estes desafios têm a haver com a fé na ressurreição.
Contudo, morrer é como nascer. A pessoa, ao nascer, fica em crise por entrar em contato com uma realidade diferenciada do útero da mãe. Mas a criança deve nascer, senão morre. Na situação de morte, entra-se em crise também, por entrar em contato com outro mundo diferente, a totalidade. Por sua vez, para a fé cristã, na medida em que vamos morrendo, vamos ressuscitando para eternidade. Isso dá segurança.
Na história se associou a morte com o pecado. Mas é significativo pensar a morte não como conseqüência do pecado. Conseqüência do pecado é a forma como experimentamos a morte. O pecado consiste em querer viver só para si mesmo, longe da comunidade, sem se relacionar e se solidarizar. A solidão no lugar da solidariedade, por exemplo, faz com que a morte seja vivenciada como assalto e destruição. O isolamento, o individualismo e o distanciamento da comunidade de fé do “lado de cá”, faz sustentar a idéia da solidão do “lado de lá”. Neste caso, o medo e até o pavor da morte cresce devido ao um sentimento de culpa; endividados com Deus tememos não receber o céu.
De fato, o céu parece ser a potencialidade daquilo que já na terra experimentamos. Sempre que na terra fazemos experiência do bem, da felicidade, da amizade, da paz, da justiça e do amor, já estamos vivendo, de forma parcial, mas real, a realidade do céu.
Neste dia dos finados reconheçamos a necessidade de equilíbrio, de uma fé comprometida com o sonho de Deus, que enviou seu filho para mostrar o caminho da salvação.
“Deus não enviou o seu Filho ao mundo para condenar o mundo, mas para que o mundo seja salvo por ele. Quem nele crê não é condenado, mas quem não crê já está condenado, porque não acreditou no nome do Filho unigênito. Ora, o julgamento é este: a luz veio ao mundo, mas os homens preferiram as trevas à luz, porque suas ações eram más. Quem pratica o mal odeia a luz e não se aproxima da luz, para que suas ações não sejam denunciadas. Mas quem age conforme a verdade aproxima-se da luz, para que se manifeste que suas ações são realizadas em Deus". (Jo 17-21).